É  paradoxal: quanto mais se evidenciam as mudanças climáticas e mais  graves são as notícias de desastres nessa área, mais parece crescer o  ceticismo em torno da possibilidade de se chegar a um acordo global  (porque precisa ter essa abrangência para ser efetivo) que possa reduzir  em quantidade suficiente as emissões de gases que intensificam o efeito  estufa e favorecem os "eventos extremos". Estamos deixando "a ganância  levar vantagem", diz Jeffrey Sachs, que já foi um dos mais  conceituados especialistas em finanças no mundo e hoje é professor da  Universidade de Columbia e secretário-geral das Metas para o Milênio, da  ONU.
É nesse ambiente de pessimismo que começa na segunda-feira, em Bangcoc, mais uma reunião preparatória da Convenção do Clima para o encontro decisório do final do ano na África do Sul. No final de abril haverá também uma reunião específica no México para tentar avançar com o projeto do Fundo Verde para o Clima,  que tem como alvo os US$ 30 bilhões que os países industrializados se  dispuseram em Copenhague a viabilizar para os mais pobres, na rota  delineada para chegar a US$ 100 bilhões até 2020. Mas já sabendo - como  advertiu a secretária-geral da convenção, Christiana Figueres -  que "até agora países industrializados e os demais só anunciaram  reduções de emissões correspondentes a 60% do que a ciência diz que  precisa acontecer até 2020, para que a temperatura do planeta não suba  além de 2 graus Celsius e não provoque desastres ainda maiores" (UNFCCC,  25/3).
Christiana Figueres tem "implorado" a todos os países que avancem mais e ao Japão, que não vete um novo Protocolo de Kyoto (o atual, que expira em 2012, permite a países industrializados financiar projetos redutores de emissões nos  demais países e descontar as reduções no seu balanço próprio). Mas já  tem pela frente uma posição anunciada pelos "emergentes" em Nova Délhi  (UPI, 28/2): as propostas aprovadas em Cancún, em dezembro último, não  são um bom caminho, não substituem o chamado roteiro de Bali, desenhado  há alguns anos e até agora sem cumprimento. E Arthur Runge-Metzer,  estrategista da União Europeia nessa área, acha quase impossível um  acordo na África do Sul: considera o panorama "assustador" (Bloomberg,  24/3). Para complicar, um subcomitê do Congresso norte-americano retirou  da Agência de Proteção Ambiental os poderes para regular emissões no país - solapando, assim, o centro da política do presidente Barack Obama para o clima (The New York Times, 10/3).
Segundo o Instituto Gallup, só 51% dos norte-americanos se dizem muito preocupados com a questão (eram 66% há três anos, segundo a CBS News).
Para complicar ainda mais a questão, o acidente nuclear no Japão coloca muitas dúvidas novas no cenário da energia.  Como fará cada país, cada região, diante das ameaças evidenciadas? Cada  um, cada uma, está reavaliando as usinas instaladas e se preparando  para tomar posições. Para muitos, uma mudança nessa área pode significar  problemas e custos imensos - como na França, no próprio Japão, na  Rússia, nos EUA.
Enquanto  isso, ao lado de relatos dramáticos sobre eventos extremos e suas  consequências em várias regiões brasileiras e em outros países,  cientistas advertem que a Groenlândia e a Antártida  perderam mais gelo do que se previa, em consequência de uma elevação  maior do que a esperada no nível dos oceanos (O Globo, 11/3). A Organização Mundial de Saúde  afirma que os eventos extremos na Europa aumentaram 65% entre 1998 e  2007, período em que 40 milhões de pessoas ali pediram ajuda para os  problemas de saúde e alimentação decorrentes - 400% mais que nas duas  décadas anteriores. Relatório do Banco Mundial - Desenvolvimento e Mudanças Climáticas 2010  - assinala que 75% dos prejuízos com os eventos ocorrem nos países "em  desenvolvimento". Se o aumento da temperatura ultrapassar 2 graus, o PIB  da África e do Sudeste da Ásia poderá cair de 4% a 5%.
A  destruição dos ecossistemas costeiros - manguezais, brejos e terras  alagadiças à beira-mar - está liberando uma quantidade gigantesca de  dióxido de carbono. Porque eles podem conter até cinco vezes mais  carbono que as florestas tropicais, segundo o Grupo de Trabalho Internacional para Carbono Azul Costeiro (Conservation, 25/3). Em alguns pontos, podem ser 50 vezes mais.
Ainda  estão sobre a mesa as intenções (não compromissos obrigatórios) dos  países industrializados de reduzir suas emissões até 2020: de 20% a 30%  sobre as de 1990, na União Europeia; 25% no Japão; de 15% a 25% na  Rússia; 17% (calculadas sobre as de 2005) nos EUA, que pretendem chegar a  30% em 2015, a 42% em 2030 e a 83% em 2050. Mas tudo dependerá das  futuras reuniões do clima.
Fonte: ihu.unisinos.br
Enviado por Vasconcelos Filho
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