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segunda-feira, 2 de abril de 2012

COPA 2014 – MP investiga exploração da sensualidade de meninas

Por Hegla Oleiniczak em Cidadania

Site é suspeito de usar meninas de biquíni para promover a Copa em MT.
Procurador quer investigar suspeita de prostituição e de exploração sexual. Responsável pelo site nega irregularidade e será ouvido pela Polícia Civil.

A pouco mais de dois anos do início da Copa do Mundo no Brasil, o Ministério Público do Estado de Mato Grosso e a Polícia Civil de Várzea Grande, cidade próxima à capital Cuiabá, uma das sedes do mundial, investigam uma agência de modelos itinerante suspeita de usar sem autorização produtos da Fifa e ainda infringir o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA).

De acordo com a Procuradoria Especializada em Defesa da Criança e do Adolescente de Mato Grosso, o grupo “Garota Copa Pantanal 2014″ divulga na internet vídeos e fotos de garotas menores de 18 anos em posições sensuais com camisetas promocionais alusivas ao torneio de futebol. A Delegacia Especializada de Defesa da Mulher, da Criança e do Idoso em Várzea Grande apura o caso. A Secretaria Extraordinária da Copa do Mundo (Secopa) em Cuiabá também foi acionada.
 
O responsável pelo grupo “Garota Copa Pantanal 2014”, Reinaldo Luís Akerley Cavalcante, de 40 anos, negou as suspeitas de que poderia estar explorando sexualmente as garotas. A delegada Daniela Silveira Maidel aguarda nesta quinta-feira (29) o dono da agência de modelos para depoimento.

A pedido do procurador Paulo Roberto Jorge do Prado, a delegada instaurou inquérito em 9 de março para investigar se os responsáveis pela agência de modelos cometeram crime de exploração sexual ou prostituição de criança ou adolescente. Procuradoria e Polícia Civil também já solicitaram à Justiça a retirada dos sites usados pela empresa para divulgar as imagens das adolescentes.

Segundo Cavalcante, responsável pelo site, ocorreu uma “falha” na produção das imagens que mostram menores de idade em poses sensuais e isso será avaliado pela equipe de trabalho do seu curso de modelos. “Nosso objetivo não é mostrar sensualidade. É mostrar a beleza da mulher pantaneira”, afirma Cavalcante, dono da Reynaldo Eventos Comunitários. De acordo com ele, as garotas integram um grupo itinerante de modelos que “leva a beleza da mulher matogrossense e ajuda a divulgar a Copa do Mundo em Cuiabá”.

A polícia diz que já ouviu cinco adolescentes, e todas negaram ter sido vítimas de exploração sexual ou prostituição.

Entre o final de fevereiro e o início deste mês, o procurador Paulo Prado encaminhou ofício à Secretaria de Estado de Segurança Pública do Mato Grosso solicitando a abertura de inquérito da Polícia Civil porque, no seu entendimento, o conteúdo das imagens que estão sendo veiculadas com as garotas na internet fere o artigo 244 A da Lei 8.069, de 1990, do ECA, que trata das questões e punições relacionadas a quem submete menores “à prostituição ou à exploração sexual”. A pena prevista para quem comete esse tipo de crime é de “reclusão de quatro a dez anos, e multa”.

A Secopa comunicou à agência sobre o uso indevido da marca da Fifa. A entidade pediu para Cavalcante retirar a logomarca da federação das camisetas e não usar mais o nome “Copa 2014″. De acordo com o governo do Mato Grosso, não há nenhum vínculo entre a administração e o evento.

Camiseta molhada

O site do grupo mostra integrantes de 14 a 17 anos. Elas aparecem nadando em piscinas e se banhando em chuveiros. As adolescentes usam biquínis – alguns fio dental -, camisetas molhadas – uma chega a erguer a roupa para mostrar o sutiã do traje de banho -, shortinhos, minissaias – a calcinha de uma aparece nas imagens -, e decotes.

Os vídeos começam com a imagem do colo de uma garota com a camiseta com o nome do grupo. Além de focar os seios das participantes, os closes também valorizam os bumbuns. As garotas dançam, sorriem, mandam beijos ou fazem ‘coraçõezinhos’ com as mãos ao som de músicas como, por exemplo, “Baby”, do cantor canadense Justin Bieber.

Viagens
Apesar de o evento “Garota Copa Pantanal 2014″ ter surgido na cidade de Várzea Grande, que faz limite com Cuiabá, ele levou as garotas para locações em piscinas, parques aquáticos, hotéis, pousadas no meio da mata, cachoeiras, rios, lagoas e praias espalhados pelo Brasil. As candidatas já foram filmadas e fotografadas de dia e de noite em São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro, onde estiveram durante o carnaval deste ano.

Num vídeo de três minutos de duração, postado em abril de 2011, no qual mostra uma adolescente de biquíni fio dental, então com 14 anos, uma mensagem sugere que as candidatas podem fazer viagens internacionais: “Vou sim, amigo, vou entrar em contato para marcarmos a ida das modelos da Copa do Mundo 2014 a Lisboa”, escreve um dos organizadores.

No site do grupo, uma notícia postada no dia 6 de agosto de 2011 informa que a mesma garota irá para Zurique, na Suíça, em 2013, participar do sorteio das sedes da Copa das Confederações, que também ocorrerá no Brasil. Atualmente, essa participante está com 15 anos.

Na página do evento, as idades das participantes aparecem nas suas fichas técnicas com as fotos correspondentes. Há uma descrição que informa que todas as menores têm autorização dos pais e responsáveis para participar das sessões de fotos e filmagens.

Procurador
“O modo como as participantes são apresentadas é preocupante e, por esse motivo, os responsáveis pelo evento e pela divulgação das imagens têm de ser investigados. Em tese, elas configuram a figura penal de exploração sexual das meninas. Mas também tem de ser apurado se existe ou não prostituição envolvida ali”, diz o procurador Paulo Prado.

“Não podemos vender a imagem do Brasil como um palco de prostituição infantil. Não podemos admitir que isso aconteça e que essa imagem seja vendida. O que o estrangeiro vai pensar? Que é um subpaís onde ninguém liga para suas crianças e adolescentes? Existe um fator da proteção que é necessário aqui. Os responsáveis estão se promovendo de forma fraudulenta, no mínimo”, afirma o procurador.

No documento que Paulo Prado encaminhou em 29 de fevereiro ao secretário de Estado de Segurança Pública de Mato Grosso, Diógenes Gomes Curado Filho, ele pede a “devida instauração de inquérito policial e a retirada imediata da exposição dessas jovens da internet”.

No ofício, a Procuradoria da Criança e do Adolescente informa que há “exposição indevida de meninas entre 13 e 18 anos de idade, em trajes sumários [...], tendo como agravante o fato de estarem autorizadas por familiares e genitores”.

Secretário

Em entrevista por telefone, o secretário Diógenes Filho disse que assistiu a alguns vídeos do concurso. “Existe uma linha tênue entre exposição de beleza e erotismo. É uma questão de apuração e a polícia fará isso”, afirma ele, que indicou uma delegacia especializada para investigar o caso.

Delegada

Procurada, a delegada Daniela Maidel, da Delegacia Especializada de Defesa da Mulher, da Criança e do Idoso em Várzea Grande, disse que investiga se os organizadores da agência de modelos cometeram crime. “Recebemos informação do Ministério Público sobre existência dos sites. Diante disso, instauramos inquérito policial para apurar o crime de submeter criança ou adolescente à prostituição ou exploração sexual, de acordo com o artigo 244 do ECA. Também pedimos a Justiça a retirada desses sites da internet.”

No entendimento da delegada, as imagens das garotas não devem ser divulgadas na internet. “Os vídeos dão a entender que elas estão ali dispostas a ser agenciadas para programas. Mas ao mesmo tempo, os sites dão uma sensação de legalidade ao postar vídeos com uma garota vestindo uma camiseta alusiva à Copa, como se existisse algum órgão oficial por trás do evento. Mas isso não é verdade porque tivemos informação que a Secopa não tem vínculo com essa agência e já está tomando medidas administrativas para impedir o uso de imagens de símbolos da própria Copa com o grupo de modelos”, afirma Daniela Maidel.

“Até agora, não encontramos nada que comprove exploração sexual ou prostituição em relação a essa agência, mas vamos avaliar se a agência incorreu em crime também ao usar incorretamente a imagem da Fifa. Se isso ficar comprovado, vou sugerir que alguma outra delegacia investigue o caso”, afirma a delegada.

Cinco adolescentes que integram o grupo “Garota Copa Pantanal 2014″ foram ouvidas na semana passada pela delegada. “Elas vieram acompanhadas das mães e negaram ser vítimas de exploração sexual ou prostituição. Ouvimos as meninas em separado também. As mães disseram que deram autorização às filhas para integrarem o grupo e viajarem com os organizadores dos concursos. Mas procuramos outras jovens. Elas consideram posar com biquínis sumários a coisa mais natural possível. Consideram como um trabalho de modelo. São meninas de famílias humildes, são pessoas simples que se deslumbram com a esperança da fama. Em vários outros eventos percebemos que meninas são iludidas. Isso é perigoso.”

Mesmo que a Polícia Civil não encontre ligação dos vídeos com uma suposta rede de exploração sexual ou prostituição de adolescentes, os responsáveis pela agência deverão ser responsabilizados pela veiculação das imagens das menores em poses sensuais na internet.

“Temos que ver qual a intenção dessa agência ao expor as imagens. O que ela ganha com isso? Eu entendo que o simples oferecimento das garotas, a intermediação com agenciadores, configura exploração sexual ou prostituição”, afirma Daniela Maidel, que apura também a existência de outra agência de modelos que estaria usando o indevidamente o nome da Copa do Mundo de 2014 em Cuiabá para promover garotas.

“Tem que ver se a agência intermediou, propôs ou marcou encontro das adolescentes com alguém. A exposição das imagens poderia incorrer em outros crimes, mas tudo leva a crer que houve também exibição das imagens das menores com o intuito de exploração sexual”, diz. “Tenho informações de uma das garotas que ouvi que esse outro grupo a teria oferecido para fazer programas sexuais”.

Secopa

Segundo Mauricio Estrada, assessor especial da Secopa em Cuiabá, órgão ligado ao governo do estado do Mato Grosso para cuidar das questões relacionadas ao próximo mundial de futebol no Brasil, o grupo “Garotas Copa Pantanal 2014” já foi notificado sobre o uso ilegal da marca da Fifa.

“Esse concurso, esse grupo, usava a taça da Copa do Mundo e o logotipo da candidatura na camiseta. Esses símbolos não podem ser utilizados sem autorização. Acredito que o nome Garota Copa Pantanal 2014 também não pode ser utilizado. Isso está sob análise da Fifa”, diz Estrada.

Opiniões
De acordo com a Safernet Brasil (organização da sociedade civil sem fins lucrativos que atua na proteção e promoção dos direitos humanos na internet), o “Garota Copa Pantanal 2014″ tem uma conta e perfil de usuário na página de um site internacional em que foram encontradas postagens de vídeos com cenas eróticas de crianças e adolescentes.

“São mais de 1.050 vídeos postados pelo grupo. Quem está investigando o caso precisa saber por que os vídeos de um grupo de modelos no Brasil estão sendo postados em um site estrangeiro que mostra cenas eróticas de crianças e adolescentes”, diz Thiago Tavares, presidente da Safernet Brasil.

Em 2011, a Safernet encaminhou 707 páginas na internet com conteúdo suspeito de tráfico de seres humanos para fins de exploração sexual à CPI do Tráfico de Pessoas no Senado. “Durante uma audiência pública, também sugerimos a investigação de falsas agências de modelo que recrutam mulheres e adolescentes para exploração sexual no Brasil e no exterior”, afirma Tavares.

“Tem vários casos de falsas agências de modelos recrutando adolescentes para eventos. Os recrutamentos são feitos pela internet. Os pais precisam estar em alerta para isso”, diz o presidente da Safernet.

“É preciso existir uma fiscalização forte nessas agências de modelo para evitar que elas erotizem uma criança”, afirma o senador Magno Malta (PR-ES), integrante da subcomissão de enfrentamento e debate sobre pedofilia no Brasil.

O que diz o grupo
Reynaldo Eventos nega as suspeitas do Ministério Público de que tenha explorado sexualmente as integrantes menores de idade do seu grupo “Garota Copa Pantanal 2014″ ao exibir imagens delas em poses sensuais e trajes de banho pequenos.

“Os vídeos são artísticos e as meninas são modelos. As menores de 18 anos têm autorização dos pais para fazer o trabalho artístico. A comunidade pensa que são concursos de beleza que terão em 2014, mas não são. São garotas, modelos contratadas que querem se destacar. Dou esse curso de modelo e manequim. Elas aumentam a estima, fazem amigos, percorrem o Brasil inteiro. Do Rio de Janeiro a Gramado, no Rio Grande do Sul. Elas passam levando Mato Grosso para o mundo. Cada uma ganha R$ 50 por dia de trabalho. São quase 50 garotas, entre maiores e menores”, diz Reynaldo.

“Elas não podem usar tatuagem, não podem alterar o uniforme, que é a camisa da Copa, não podem namorar, fumar e beber quando estiverem usando a camisa. Elas têm que ser exemplo de mulher para o mundo. A garota que deseja ser garota Copa precisa mostrar as belezas naturais”, informa.

Questionado sobre a investigação da Procuradoria e da Polícia Civil, que analisou vídeos com menores de idade sendo mostradas demasiadamente usando fio dental, Reynaldo reconhece que “se alguma menor de idade foi exibida em trajes sumários, isso feriu o ECA”.

O responsável pelo site afirma, no entanto, que “quanto mais críticas e elogios, melhor”. “São bem vindos. Queremos que a sociedade mostre o que está errado. Queremos saber quais são as falhas”, comenta.

Eu peço para as meninas na praia ou cachoeira não desatarem o biquíni. (…) A escolha dos tamanhos e modelos dos biquínis é delas e não é uma exigência minha. Elas é que pedem para filmar a parte de baixo”.

Reynaldo Cavalcante, responsável porsite
“Houve falha, mas não foi só minha. Se o Ministério Público viu falha chocante nas imagens, quero dizer que eu busco não cometer essa falha. Eu não percebi os vídeos de meninas menores com trajes de banho pequenos. Quando os vídeos são de menores evitamos cometer ‘falha de imagem chocante’. Eu peço para as meninas na praia ou cachoeira não desatarem o biquíni. Elas dizem que foi a mãe que comprou. A escolha dos tamanhos e modelos dos biquínis é delas e não é uma exigência minha. Elas é que pedem para filmar a parte de baixo.”

De acordo com ele, todos os mais de mil vídeos feitos com as meninas passaram por seu crivo antes de serem divulgados. “Todos os vídeos passam por mim, mas ocorrem erros e falhas. Mas estamos trabalhando para até 2014 essas falhas acabarem”, diz Reynaldo.

Reynaldo nega que tenha postado vídeos das garotas em um site internacional suspeito de divulgar imagens eróticas de menores de idade. Ele afirma ainda que a maioria das viagens é custeada por ele. “Quando os pais querem, viajam juntos.”

Ele diz que recebe dinheiro dos patrocínios. “São empresas que colocam suas marcas atrás da camisa”, afirma Reynaldo, que pensa em mudar a maneira como as modelos são expostas no seu grupo. “Não vou fazer mais vídeos com menores de idade, só as que têm acima de 18 anos vão fazer vídeos de biquíni.”

Sobre a suspeita de que está utilizando a marca da Fifa na camiseta, Reynaldo diz que recebeu um comunicado da Secopa pedindo para que ele retirasse da roupa usada pelas garotas o símbolo do mundial no Brasil em 2014. “Já tirei da camiseta a taça da Copa”, afirma.
 
FONTE G1 SP

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