Por: Cleomar Almeida
Após 21 anos em Goiânia, o padre Geraldo Marcos Labarrére Nascimento, 70 anos, deu adeus, na noite desta terça-feira (27/9), às crianças e aos adolescentes da Casa da Juventude (Caju), no Setor Universitário, na capital. “Estou saindo do mundo”, brincou ele, que, pela segunda vez, deixa uma cidade após sofrer ameaças policiais.
Autêntico defensor dos diretos humanos, o padre sai da capital em meio a ameaças de morte intensificadas a partir de março deste ano, após ser presa uma organização criminosa composta por policiais militares, durante a Operação Sexto Mandamento da Polícia Federal. Na época, o arcebispo de Goiânia, Dom Washington Cruz, recebeu um recado de uma pessoa, dizendo que o padre iria ser vítima de um acidente ou de latrocínio – roubo seguido de morte.
Mesmo preocupado, o religioso seguiu com suas atividades na Caju, onde são realizados trabalhos com crianças e adolescentes de baixa renda. Entretanto, passado um tempo, as ameaças se repetiram. Ele recebeu outro recado, antecipando que iriam tentar implantar, na residência, pacote com drogas, filmes pornôs e vídeos de pedofilia, o que serviria para, posteriormente, denegrir sua imagem e até para representá-lo, na Justiça. Esse aviso também teria sido destinado ao presidente da Comissão de Direitos Humanos, Cidadania e Legislação Participativa, deputado Mauro Rubem, e ao especialista em políticas públicas Fábio Fazzion.
Dias de aflição
Sem lembrar a data, Nascimento também contou que câmaras do circuito de segurança da Caju gravaram os momentos em que 26 carros da Polícia Militar (PM) passaram, ao longo do dia, em comboios. Segundo ele, os policiais que estavam nos carros faziam a ronda olhando para a casa. “Nós já ficávamos atentos a qualquer atitude e sabíamos que estamos no alvo de ameaça", disse o religioso, acrescentando que, depois, o portão da Caju foi alvo de tentativa de arrombamento.
Na manhã de 11 de maio, um motociclista, não identificado, teria estacionado o veículo na calçada da casa e mexido no portão, que ainda tinha sinais da tentativa de arrombamento. Com base nos registros das câmeras, o padre disse que o homem ficava olhando na rua para ver se havia alguém. Em seguida, após tentar assediar uma moça que passava no local, o suspeito foi embora, disse o padre.
Em 14 de maio, um senhor de aproximadamente 50 anos teria passado em frente à Caju, no momento em que um funcionário consertava o portão com sinais de violência. O homem pediu para usar o banheiro da casa e o funcionário fez questão de o acompanhar. O padre disse que o empregado, em alerta por causa das ameaças, viu uma arma no bolso do suposto visitante, apontado como policial.
"Caixão sob encomenda"
As ações de intimidação também foram comuns em agosto. Naquele mês, um homem ligou para a Caju, não quis dizer o seu nome e exigiu que o atendente repassasse o telefonema ao padre, segundo informado. Por causa da resistência em não divulgar sua identidade, o autor da ameaça foi impedido de falar com o religioso, mas, antes de desligar, mandou dizer a Nascimento que estava fazendo o caixão dele.
Opção de vida
Em meio às incessantes ameaças de morte, o padre teve de seguir para outra cidade, onde deve continuar seus trabalhos em defesa de menos injustiça, exclusão e qualquer forma de abuso. Para ele, há indícios de que integrantes da PM podem ser os autores das ameaças, assim como ocorreu em Manaus (AM), que teve de deixar em 1990. "Não estou magoado com a minha saída. Ela ocorre em um bom momento. Vou continuar com o trabalho pela justiça e pelo respeito, que, para mim, é uma opção de vida", concluiu.
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