Mediante ação da Comissão da Verdade e Memória Dom Hélder Câmara, de Pernambuco, a Justiça autorizou a correção do registro de óbito do estudante alagoano Odijas Carvalho, assassinado pela ditadura militar em fevereiro de 1971, aos 26 anos, nas dependências do Hospital da PM, no Recife. Ao invés de “embolia pulmonar”, o documento passará a registrar como causa mortis “homicídio provocado por lesões corporais múltiplas decorrentes de atos de tortura”.
A sentença da juíza da 12ª Vara do Recife, Andrea Epaminondas Tenório, foi publicada no Diário Oficial do Estado e, dentro de 15 dias, o cartório de registro civil onde está homologado o óbito expedirá novo documento.Segundo informa o secretário-geral da Comissão Hélder Câmara, Henrique Mariano, esta é a primeira retificação de óbito conseguida pela Comissão da Verdade pernambucana.
Obteve a conquista, ressalta Henrique Mariano, depois de passar um ano reunindo documentos públicos, reportagens e ouvindo testemunhas das torturas sofridas pelo estudante, antes de fazer a solicitação judicial em nome da viúva de Odijas, Maria Ivone Loureiro Ribeiro.
“A agonia de Odijas se deu no cárcere…”
Na sentença, a juíza afirma que tomou sua decisão fundamentada em parecer favorável do Ministério Público de Pernambuco (MP-PE) e no levantamento da Comissão estadual da Verdade. A promotora de justiça Luciana Braga Costa, da 32ª Promotoria Cível do Recife, destacou em seu parecer que “a agonia de Odijas se deu no cárcere, mas as provas de sua ocorrência estão hoje postas sob as nossas vistas: em campo aberto, à luz clara do dia, após minuciosa apreciação em instâncias diversas”.
Líder estudantil da faculdade de Agronomia da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), Odijas era militante do Partido Comunista Brasileiro Revolucionário (PCBR) e foi preso na Praia de Maria Farinha, no município metropolitano de Paulista, no dia 30 de janeiro de 1971. O assassinato foi denunciado em depoimentos prestados na Auditoria de Guerra da 7ª Região Militar no final da década de 1970.
Os ex-presos políticos Mário Miranda, Carlos Alberto Vinicius e Lylia Guedes testemunharam as torturas infringidas a Odijas na sede do DOPS-Recife, que culminaram com sua morte. “Odijas foi massacrado”, concluiu Nadia Brayner, uma das relatoras da comissão da verdade pernambucana. Seu corpo foi enterrado no Cemitério de Santo Amaro, do Recife, sob o nome de “Osias” de Carvalho Souza, o que dificultou a sua localização.
Explorar todas as possibilidades legais de apurar os crimes da ditadura
A correção do atestado de óbito de Odijas Carvalho mostra a importância de explorar todas possibilidades legais de comprovar judicialmente os crimes da ditadura até o dia em que o país e o povo – ou o Congresso Nacional – conseguirem revogar a anistia dada aos crimes da ditadura e aos seus autores.
É um caminho, é uma via, até o dia em que o Supremo Tribunal Federal (STF), ao contrário do que fez há algum tempo validando a anistia recíproca, extensiva também aos criminosos na ditadura, reconhecer que crimes como o assassinato de Odijas Carvalho na tortura e o ocultamento de seus restos mortais são imprescritíveis.
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