Especialistas dizem que partidos estariam dificultando acesso às decisões da estrutura partidária.
Se o eleitorado brasileiro não tem preconceito em votar nas mulheres, por que a participação feminina na política cresce apenas 1%, em média, a cada eleição? Parte da resposta talvez se encontre nos partidos, que não estariam praticando ‘democracia de gênero’, por exemplo, ao dificultar o acesso das mulheres às esferas decisórias da estrutura partidária.
“Em parte, é verdade que a mulher não se interessa pela política, porque a campanha é um jogo de cargas marcadas. Ela sofre com a falta de espaço na televisão (propaganda eleitoral), de recursos, de apoio nos partidos. No dia em que os partidos mudarem a relação com as mulheres, pode ter certeza que seu interesse será proporcional à mudança das estruturas (partidárias)”, aposta o demógrafo José Eustáquio Diniz Alves, professor de mestrado na Escola Nacional de Ciências Estatísticas (Ence/IBGE).
Mas a conta desta exclusão não pode ser cobrada apenas dos partidos. A sobrecarga dos afazeres domésticos sobre as mulheres – que já respondem por 44% da força de trabalho brasileira – também é um fator de peso a distanciar a mulher da prática política, segundo ressaltou a professora Clara Araújo, do Programa de Pós-Graduaçãoem Ciências Sociaisda Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj).
“As mulheres trabalham em casa mais que o dobro de horas dedicadas pelos homens: 26 horas contra 10 horas semanais”, comentou a pesquisadora.
Lanterna
Este cenário foi revelado, na última terça-feira, durante audiência pública da Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa (CDH) do Senado. Detalhes dessa realidade constam no livro ‘Mulheres nas Eleições2010’, lançado na ocasião e elaborado com a participação de José Eustáquio Diniz e Clara Araújo.
O demógrafo espera que a publicação contribua para acelerar o processo de paridade nas disputas políticas. E, neste esforço para vencer o “déficit democrático de gênero”, que ajude a tirar o Brasil da posição de lanterna quanto à participação feminina no cenário político internacional.
“O Brasil tem menos de 10% de mulheres na política, perdendo até para o Iraque e o Afeganistão. Para dividir paritariamente (os cargos políticos) com os homens, as mulheres vão levar quase 150 anos, já que o ritmo de crescimento é de 1% a cada eleição”, observou José Eustáquio Diniz.
Trajetória
A mulher pode até nem ser tão discriminada na divisão do espaço do horário eleitoral, mas costuma sempre aparecer ao lado de uma liderança partidária –normalmente, do sexo masculino – para imprimir maior credibilidade a sua candidatura. Esta peculiaridade foi levantada por Clara Araújo, que assinalou uma terceira característica da trajetória feminina na política. Além de chegar às disputas eletivas por influência familiar ou pela via do associativismo, a atuação na gestão pública tem rendido bons resultados eleitorais às mulheres.
Um exemplo de sucesso nas urnas impulsionada pela ação administrativa foi a eleição de Dilma Rousseff para a Presidência da República em 2010.
“Ela foi ministra de Minas e Energia e da Casa Civil e teve o apoio do presidente Lula, que era muito popular, além de ser de um partido forte e de ter o apoio de uma grande coligação, que tinha espaço na televisão e recurso. Tendo este arranjo, mesmo uma mulher que nunca disputou um cargo de vereador conseguiu ser presidente da República”, considerou José Eustáquio Diniz.
A experiência pessoal da própria presidente da CDH, senadora Ana Rita (PT-ES), reforça esta constatação dos pesquisadores.
“Antes de vir para o Senado, eu fui apenas vereadora. Mas assumi este espaço com muita força e disposição e tenho procurado fazer a minha parte da melhor maneira possível”, sustentou Ana Rita.
Autora do requerimento de debate, a senadora Lídice da Mata (PSB-BA) afirmou que o Congresso deve encontrar meios para promover uma crescente e contínua participação das mulheres na política brasileira.
O livro Mulheres nas Eleições 2010 pode ser baixado gratuitamente pela internet no site www.bibliotecafeminista.org.br.
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