Trinta anos depois do trágico incêndio que atingiu a antiga Vila Socó, em Cubatão, no litoral de São Paulo, a Comissão da Verdade do Estado de São Paulo “Rubens Paiva”, se debruça sobre o episódio ocorrido em 24 de fevereiro de 1984, que deixou um número de mortos e desaparecidos até hoje não devidamente esclarecidos. O incêndio que teve o maior número de vítimas fatais no Brasil, ocorreu em uma área de segurança nacional.
O desastre ocorreu após o vazamento de 700 mil litros de gasolina de um duto da Petrobras que passava sob as palafitas da favela, onde, à época, moravam seis mil pessoas. O número oficial apresentado pela Petrobras, dirigida por Sigheaki Ueki foi de 93 mortos. Porém, de acordo com investigação feita pelo Ministério Público, o número seria de 508 mortos, “podendo chegar a 700”, afirma Dojival Vieira, da Comissão da Verdade da OAB de Cubatão, que era vereador da cidade quando do ocorrido. Após o incêndio, Vieira ouviu de um morador sobrevivente o seguinte pedido: “Não permita que nossa história vire cinza”. Vieira relata que na época a população não acreditou no número oficial de mortos. “Sempre se soube que esse número seria maior”.
Suspeita-se que o governo militar, que à época tinha como presidente o general João Batista Figueiredo fez uma “Operação Abafa”, para reduzir o número de mortos e o impacto da tragédia. “Obviamente que isso foi feito para reduzir a repercussão no âmbito interno e internacional, já que era uma empresa estatal gerida pelo governo militar”. Entre os presentes na audiência realizada pela Comissão da Verdade de SP, estará um sobrevivente, que trabalhou no resgate dos corpos do incêndio: “Essa testemunha afirma que foram colocados de três a quatro corpos em cada caixão. Isso confirma o que viemos dizendo ao longo desses 30 anos. Que houve, de fato, a manipulação do número de mortos para reduzir o impacto das tragédias. Ou seja, o número foi muito maior, mas ninguém foi punido”, esclarece Vieira.
Ele lembra que nenhuma investigação foi feita para apurar as causas da tragédia, “muito menos as responsabilidades”. Além disso, ressalta que o caso não pode ser chamado como “tragédia”: “Tragédias não são previsíveis. No caso da Vila Socó, o incêndio resultou do total descaso da empresa com a manutenção dos dutos e tubulações. E em seguida o poder público se omitiu de uma operação de evacuação. Haveria tempo para isso”. O vazamento, relata, “começou muito antes do incêndio”. Vieira ressalta a importância do tema estar sendo trazido novamente à tona pela Comissão da Verdade de São Paulo, em parceria com a Comissão da OAB de Cubatão. “Nossa proposta é que anos depois o Brasil conheça toda a dimensão dessa crueldade, do desrespeito aos direitos humanos mais elementares. Foi um crime praticado pela ditadura contra toda uma população civil”.
Fonte: Assessoria da Comissão Estadual da Verdade de São Paulo "Rubens Paiva"
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